Isamara, campeã que abriu o caminho para o Brasil na Ginástica Aeróbica

09.08.2020  |    1.456 visualizações

Com muito talento e criatividade para criar coreografias, ginasta jundiaiense brilhou como poucas

 

Da Redação, São Paulo (SP) - Isamara Secati fazia jazz às quartas e às sextas-feiras no São Paulo Futebol Clube. Um dia recebeu a informação que a professora não poderia mais comparecer às sextas. Foi então conferir as aulas de aeróbica. Estava começando aí a trajetória vencedora de um dos nomes mais importantes da história da modalidade no Brasil.

Com muita facilidade para dar saltos, deslocar-se e fazer as coreografias rápidas, a ginasta jundiaiense logo se destacou em nível nacional. Logo no primeiro Mundial organizado pela Federação Internacional de Ginástica, em Paris, no ano de 1995, foi ao pódio. Na edição seguinte, em 96, na cidade alemã de Hannover, faturou a medalha de ouro.

Talentosa, criativa e disciplinada, Isamara ganhou seguidores – não no sentido que se emprega hoje em dia, pois não havia redes sociais então. A criançadinha do Tricolor realmente ia atrás dos passos da atleta. Isamara e sua treinadora, Luciana July, estavam apenas começando a escrever páginas gloriosas da Ginástica Aeróbica do Brasil. Confira mais no texto desta semana do Memória de Ouro CBG.

 

Isamara, a campeã que parecia mágica

Com incrível facilidade para a aeróbica, em poucos anos a ginasta jundiaiense brilhou até chegar ao topo do mundo, encantando as gerações seguintes

 “Não é magia, é tecnologia”. Quem via televisão nos anos 90 haverá de se lembrar da personagem interpretada por Joana Prado, a Feiticeira, divulgando o slogan da cinta modeladora Elisbelt. Aqueles que conhecem parte da trajetória de Isamara Secati, uma das ginastas que começaram a escrever a história da Aeróbica Brasileira e a firmar sua reputação, talvez até imaginem que havia algo mais em torno de seu talento, tamanha a facilidade que ela parecia ter para escalar o pódio. Seria magia? A associação de ideias entre a Feiticeira e Isamara se dá porque a atleta tomou emprestada de uma das sitcoms de sucesso nos anos 60, Jeannie é um Gênio, (A Feiticeira é outro produto da mesma época), a inspiração para uma das criativas coreografias que encantaram torcedores e juízes mundo afora. Ela já foi também Mulher Maravilha e Madonna, entre outras personagens.

“Era incrível a facilidade que a Isamara tinha para fazer os exercícios. Já tinha feito jazz, balé e Ginástica Rítmica quando começou na aeróbica. E fazia tudo muito bem. Acho que é uma coisa de dom mesmo. Pegava tudo o que eu passava muito rápido, era muito habilidosa”, diz Luciana July, treinadora da ginasta por muitos anos no São Paulo Futebol Clube.

Isamara tinha uns 11 anos de idade quando caiu de paraquedas na aeróbica. Num belo dia, recebeu a informação de que a professora de jazz do Tricolor, que lhe dava duas aulas por semana, estava impossibilitada de continuar indo ao clube às sextas-feiras. Moradora do bairro do Morumbi que enxergava o São Paulo como o seu querido quintalzão, a garota entrou na sala onde July atuava. E deu match entre a aplicada dançarina e aquele esporte tão vibrante.

“É verdade que eu tinha facilidade para muita coisa. Tirava de letra vários elementos, como os saltos, e me deslocava muito bem. Não era difícil para eu fazer aquelas coreografias rápidas. Mas tinha meus problemas com os esquadros. A diferença é que eu era muito insistente. Treinava e treinava até acertar algo que antes não estava tão bom”, recorda Isamara.

Isamara nem tinha perfeita noção de que a aeróbica era um esporte quando começaram a lhe sugerir que competisse. Nem mesmo July, naqueles primeiros anos, tinha intimidade com o código de regras – foi correr atrás de aperfeiçoamento depois, até se tornar treinadora de campeãs mundiais. “A gente começou a fazer aeróbica meio que por instinto. Cheguei ao meu primeiro Campeonato Brasileiro com um tênis superpoderoso de corrida, mas que não tinha nada a ver com aeróbica”, recorda a atleta, divertindo-se com a lembrança.

Tomando contato com as regras, treinadora e pupila resolveram mergulhar naquele mundo novo das competições. Isamara logo revelou um dom que adicionou à sua longa lista: gostava de imaginar as coreografias em seu quarto, escolhia as músicas e ia conferir, no clube, se suas sacadas faziam sentido. E faziam.

“Ficava no meu quarto quietinha, à tarde, pensando. Em uma ou duas horas, montava tudo”.

Até meados da década de 90, havia vários caminhos para chegar ao pódio: a International Aerobic Federation, com sede no Japão, a ANAC (Associação Nacional de Aeróbica Competitiva), criada nos EUA, e a Federação Internacional de Esportes Aeróbicos e Fitness, entidade originada na Finlândia. Depois de brilhar tanto no Fitness Brasil, evento associado à ANAC, como nas competições organizadas por Maurício Fernandes, vinculadas à IAF, July e Isamara souberam que a FIG (Federação Internacional de Ginástica) passaria a promover o seu Mundial.

“Quando estava em meu segundo ou terceiro ano de aeróbica, apareceu a FIG. Aí a gente começou a colocar a coreografia nos moldes daquelas regras”.

Assim foi feito. E as duas se saíram pra lá de bem logo na primeira edição do Mundial da FIG, realizado em dezembro de 95, em Paris. O bronze que Isamara conquistou aos 18 anos indicava que o talento estava sendo muito bem empregado em competições de alto nível.

Como era de se esperar, o São Paulo recebeu muito bem a notícia. O clube custeava as despesas de atletas e treinadores em competições, cobrindo passagens, hospedagem, alimentação. A conquista incentivou o Tricolor a investir também nas instalações reservadas à aeróbica. O chão duro foi recoberto por um piso especial.

A exibição de Isamara na França suscitou expectativas no mundo da aeróbica, tanto em meio ao público como também junto à imprensa especializada. Quando a delegação chegou a Hannover, sede da segunda edição do Mundial, o de 1996, uma equipe de televisão foi destacada para entrevistar a medalhista do evento anterior, e jornais e revistas também publicaram matérias sobre a forte competidora que chegava da América do Sul.

A imprensa europeia sabia o que estava fazendo. Amadurecida, segura e com aquela técnica vistosa que era sua marca, Isamara competiu com bravura e se consagrou. Aos 19 anos de idade, a jundiaiense faturou a medalha de ouro, chegando ao topo do mundo.

Curiosamente, Isamara nem reconhece aquele momento como o de seu auge no esporte. Entre diversos outros resultados notáveis, a ginasta da terra da uva ainda conquistaria a prata nos Mundiais da FIG de 98 (Catania/ITA) e 2000 (Riesa/ALE). “Diria que meus melhores anos foram 99 e 2000. Nesse período realizei minhas melhores exibições técnicas. Perdi algumas finais por 0,1. Às vezes a gente é despontuada porque caiu uma lantejoula do collant ou porque o cabelo balançou muito. É muito duro. Em alguns momentos, ao subir ao pódio, era mais aplaudida do que a vencedora. Isso me deixava um pouco menos triste. Era difícil assimilar, porque muita gente vinha me dizer que minha rotina tinha sido perfeita, e que eu merecia o ouro”.

Seja lá como for, a pioneira hoje curte as lembranças, orgulhosa por ter a consciência de que deixou um legado. “Sei que muitas crianças começaram a fazer aeróbica no São Paulo por causa de mim. O clube divulgava bastante minhas conquistas nos informativos. As meninas me conheciam e me seguiam. Uma delas era a Marcela, que me chamava de mamãe. Ela era uma pitoquinha! Um dia me disse que fui a inspiração dela. Eu a considero tão talentosa que, existindo eu ou não, ela teria se destacado de qualquer maneira, mas foi gratificante ouvir aquilo”, diz a brasileira que desbravou o pódio na Ginástica Aeróbica, referindo-se a Marcela Lopez, principal nome do País na história da aeróbica, já retratada no Memória de Ouro CBG.

Para além das conquistas, os anos de Ginástica Aeróbica são olhados por Isamara com muitas saudades. “Foi fantástico poder viajar tanto, fazer amigos no Brasil e no exterior. Eles são o principal presente, né? Eu diria que foram anos mágicos”.

E essas palavras nos remetem à Feitceira. “Não é magia...”. Era muito talento e treino, isso sim. Mas há quem diga que havia algo de mágico em Isamara. Quem poderá dizer que não estão certos?

 

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